O termo Crédito de Carbono corresponde a certificado concedido a pessoa física ou jurídica que efetiva e comprovadamente reduz suas emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE). Por convenção, um crédito de carbono corresponde a uma tonelada de dióxido de carbono (CO2) não emitido. Os demais GEE têm seu potencial poluidor convertido mediante sua equivalência em carbono, poluente mais abundante e comumente lançado na atmosfera por atividades humanas:
Valor dos Gases em Créditos de Carbono | ||
CO2 | Dióxido de Carbono | 1 |
CH4 | Metano | 21 |
N2O | Óxido Nitroso | 310 |
HFC5 | HidroFluorCarbonetos | 140 a 11.700 |
PFCs | PerFluorCarbonetos | 6.500 a 9.200 |
SF6 | Hexafluoreto de Enxofre | 23.900 |
Evolução
Vamos relembrar como o tema se desenvolveu. Na Eco92 (Rio), a preocupação com o aquecimento global, causado pela emissão de GGE, levou à criação da “Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança Climática” (UNFCCC, em inglês). Em Kyoto97, a UNFCCC estabeleceu a seus signatários compromissos mais rígidos para a redução das emissões de GEE. Contudo, para entrar em vigor, o protocolo de 1997 deveria ser assinado por países responsáveis por, ao menos, 55% das emissões globais de GGE, patamar alcançado somente ao final de 2004, com sua ratificação pela Rússia.
Em agosto de 2015, 193 países se comprometeram a envidar esforços para atingir os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas, abrangendo metas nas áreas ambiental e social. Em 12 de Dezembro do mesmo ano, durante a COP21, foi celebrado o Acordo de Paris. Neste, a grande maioria dos países desenvolvidos reiterou o compromisso de reduzir níveis de emissão de GEE e de efetuar repasses anuais, até 2020, no montante US$ 100 bilhões, para ações climáticas nos países pobres. De forma voluntária, países em desenvolvimento, como o Brasil, também se comprometeram com essa redução.
Compensações
Buscando acelerar os esforços para alcançar as desejadas reduções, o Protocolo de Kyoto prevê a possibilidade de países em desenvolvimento, como o Brasil, comercializarem reduções certificadas de emissões (RCE), através de projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), inclusive em bolsas internacionais.
Por sua vez, o Acordo de Paris prevê a criação de dois instrumentos financeiros. O primeiro se destina a negociação exclusivamente entre países, permitindo trocarem entre si os chamados “Resultados de Mitigação Internacionalmente Transferidos” (ITMOs – artigo 6.2). O segundo possibilita negociação de créditos de carbono gerados por redução de emissões em projetos privados, certificados com base em metodologias rigorosamente aprovadas (artigo 6.4). Ambos estão pendentes de regulamentação.
Mercado Voluntário
Em paralelo ao mercado regulado e obrigatório entre países, surgiu o mercado voluntário de carbono, operado através de Reduções Voluntárias de Emissões.
Neste mercado, qualquer pessoa física ou jurídica pode gerar, vender e comprar créditos de carbono voluntários. A geração destes créditos é certificada e auditada por entidades específicas. Esses créditos de carbono podem ser adquiridos para compensação por instituições obrigadas que não consigam reduzir suas emissões, mas não podem ser aproveitados para cumprimento das metas de países signatários do Acordo de Paris. Por este motivo, os preços praticados no mercado voluntário são muito superiores aos do mercado regulado.
Em decorrência de sua comercialização como commodity e sua rápida valorização, pessoas físicas e jurídicas têm adquirido créditos de carbono como ativo financeiro. As negociações do mercado voluntário ocorrem em bolsas de valores e plataformas digitais de criptomoedas.
Na Europa
Visando atingir sua meta, a União Europeia passou a legislar e a implementar regras de política climática, baseada em dois pilares fundamentais para redução das emissões de GEE:
- CELE – sistema de comércio de licenças de emissão da UE (CELE) – engloba indústrias pesadas, geradoras de eletricidade e aviação;
- Regulamento de Partilha de Esforços – compromisso de redução das emissões de GEE pelos Estados‑Membros até 2020 (Decisão n.º 406/2009/CE– Parlamento e Conselho Europeu), e reduções anuais obrigatórias entre 2021 e 2030 (Regulamentos UE 525/2013 e 842/2018, alinhando compromissos assumidos no âmbito do Acordo de Paris).
Através do CELE, a Comunidade Europeia passou a exigir de empresas dos três setores (industrial, geração de energia e aviação) o investimento em novas tecnologias limpas, que diminuam a emissão de GGE ou, em sua impossibilidade, compensação do excesso dessas emissões, mediante aquisição de créditos disponíveis, a princípio, de outras entidades europeias. As regras europeias são tão severas que, em caso de descumprimento, podem penalizar diretamente o CEO da organização infratora; as multas podem quadruplicar o montante financeiro correspondente ao excesso de emissão de CO2 no ano.
Apresentado em 2020, o “Pacto Ecológico” da Comissão Europeia propôs elevar a redução das emissões para 55% até 2030, e de extinguir emissões de gases GEE até 2050, implicando aumento significativo dos esforços.
Montadoras europeias anunciam substituir, nos próximos anos, todo portfólio de veículos à combustão por elétricos. Em 2020, em vários países da Europa, as vendas de automóveis elétricos superaram as de modelos a gasolina e a diesel, juntas.
No Brasil
Desde sempre, ouvimos o discurso político de que somos o país com mais florestas no mundo. Na verdade, as medições iniciadas em 1961 atestam que o Brasil destruiu mais de 25% de seus biomas, figurando atualmente apenas como o 31º país com maior cobertura florestal de seu território (56,1%). Finlândia (72%), Suécia (69%), Japão (67%) e Coreia do Sul (63,2%) possuem cobertura florestal do território maior que a brasileira (56,1%), além de melhores índices de desenvolvimento humano (IDH), de industrialização e de preservação ambiental. Em extensão territorial absoluta, Rússia e Canadá possuem mais florestas que o Brasil (https://ourworldindata.org/forest-area). Contudo, o Brasil possui a maior floresta tropical do planeta.
Mesmo assim, destoante de seu discurso, os governos brasileiros das três esferas de poder (notadamente a União) pouco fazem para aproveitamento do potencial natural que possuímos para a geração de créditos de carbono. Especialistas afirmam que só os recursos advindos da venda desses créditos aumentariam nosso PIB em três pontos percentuais.
A adesão de entidades privadas no mercado voluntário brasileiro ainda é modesta, realizada por corporações preocupadas com sua imagem institucional. São motivadas pelas crescentes exigências ESG impostas por consumidores e investidores, especialmente os milleniuns – geração dos nascidos a partir de 1980.
No país, o único setor regulado é o de etanol combustível que, embora em volume financeiro inexpressivo, gera créditos de carbono e consequente ganho financeiro a empresas que rodam com o combustível:
http://www.canaonline.com.br/conteudo/com-etanol-bp-busca-credito-de-carbono.html
Em 2009, o governo brasileiro instituiu a “Política Nacional sobre Mudança do Clima” (PNMC) e, em 2011, criou o “Grupo de Trabalho Interministerial sobre Mercado de Carbono”, coordenado pela Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda, com a participação de representantes de diversos ministérios.
Depois de uma década daquelas iniciativas, com o Projeto de Lei 528/21, o congresso nacional discute regulamentar o “Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE)”. Este PL só existe por pressão de lobby de empresas brasileiras, que cobra das autoridades uma regulamentação local a respeito do tema. Paralelamente, constata-se que, através de duas negociações realizadas na Bovespa, este lobby de empresas brasileiras geradores de GEE busca fixar, no mercado local, o valor unitário do crédito de carbono ao equivalente a US$10 (dez dólares). No mercado voluntário internacional, a nova moeda é cotada em Abril/21 a Є46 (quarenta e seis euros), com previsão de rapidamente alcançar entre Є70 e Є100, face às crescentes exigências impostas por autoridades e mercado europeus.
No Mundo
No mercado voluntário, embora ainda de forma tímida, os créditos já são negociados em todo o mundo, por pessoas físicas e jurídicas, em bolsas de valores (inclusive a BM&F) e plataformas seguras de criptomoedas.
Em Dezembro de 2020, relatório da ONU projeta que, caso não adotem medidas ambientais extras, Austrália, Brasil, Canadá, Coreia do Sul e Estados Unidos não devem atingir seus compromissos de redução da emissão de carbono até 2030.
Nos últimos dias 22 e 23 de Abril, 40 líderes mundiais se reuniram virtualmente na chamada “Cúpula do Clima”, apresentando metas ambiciosas de cortes de emissão de carbono. Estados Unidos anunciaram compromisso de, até o final desta década, reduzir suas emissões entre 50% e 52%, em comparação aos níveis de 2005.
Este é um caminho sem volta.
Como você e sua empresa estão se preparando para esta nova realidade?